O romance do(s) romance(s): o projeto Monte Cativo e a gênese de Sinais de fogo (Parte 2)


A gênese de Sinais de fogo

A primeira menção significativa relacionada ao início da elaboração dos Sinais de fogo aparece em uma carta a Vergílio Ferreira. Em 30 de novembro de 1964, Sena refere-se assim à obra que começara a escrever pouco tempo antes:

Neste momento, e porque as coisas comigo alternam, saltei do cansaço do concurso camoniano, para a redação de uma longa novela planejada há anos: será, através da investigação ocasional de um caso escandaloso que inclui poucas vergonhas e espíritos, um panorama oblíquo dos nossos anos 30 e 40. Será, porém, publicável? Eu não posso omitir a guerra de Espanha, decisiva para nós; nem o amoralismo hipócrita que foi o da nossa geração. […] Se chamo ao livro «longa novela» é porque, para meu uso pessoal […], o romance exige um enquadramento sócio-histórico, visível ou não, enquanto uma novela pode inseri-lo como acidente apenas. Para o meu magno Monte Cativo, tudo isto são ensaios e preparativos e, dele, de resto, o conto A Campanha da Rússia, das Andanças, é um capítulo.

O «concurso camoniano» é o de livre-docência, que se realizou nos dias 28-29 de outubro de 1964, na Faculdade de Araraquara. Portanto, um mês depois, o escritor já estaria razoavelmente avançado na composição de uma «longa novela», que abordaria «um caso escandaloso» da vida portuguesa dos anos 30 e 40. Não seria ainda o planejado Monte Cativo porque este deveria (conforme foi dito a Mécia de Sena em 1948) «dar a decomposição desorientada de um povo e a opressão da juventude». Por isso a novela em curso era ainda ensaio e preparativo para o romance: ensaio e preparativo, pensaria talvez o escritor, entendido como forma de «aparelhar-se» tecnicamente para depois dedicar-se a outra obra de maior fôlego. Não é possível determinar com precisão e segurança o que essa novela seria, se tivesse sido concluída tal como indicam as palavras a Vergílio Ferreira – o que evidentemente não ocorreu, porque se converteu progressivamente em um romance de proporções maiores. Mas é possível elaborar conjeturas plausíveis para as mudanças que a obra sofreu durante a sua gestação.

O referido caso escandaloso pode perfeitamente ser o episódio do casal de açorianos que é contado aos poucos nos capítulos II, III e IV do romance (e é citado esporadicamente nos ulteriores): uma mulher casada vai a Lisboa para encontrar-se com amantes, e em uma das ocasiões decide regressar às ilhas com um deles, o que desagrada ao marido; ela então vai viver para o continente, e o marido quer que ela volte para ele de qualquer maneira, mesmo que seja em companhia de outro homem. Essa história já havia sido iniciada anteriormente, ou pelo menos planejada por Jorge de Sena: há um texto inconcluso, ou abandonado, escrito provavelmente em 1962 ou 63, que relata de forma resumida a mesma trama, e chama-se “O Paço das Freiras”, que é o nome do palacete em que morava o casal nos Açores (Cf. Sena, 1994, p. 151-56). O primeiro parágrafo é como que uma apresentação do açoriano e da única vez em que o narrador o encontrou; esse encontro vem relatado no segundo parágrafo do texto, e é, em essência, o que também aparece nos referidos capítulos de Sinais de fogo.

A impressão que se tem, ao confrontar “O Paço das Freiras” com a primeira parte do romance, é de que o primeiro texto apresenta uma espécie de projeto desenvolvido ou esquema mais detalhado do que deveria ser depois ampliado e transformado na novela: não se lê propriamente uma narrativa dos acontecimentos, mas um resumo de cada etapa da trama – como se fosse um preâmbulo em que o narrador (neste caso, também autodiegético) informa o leitor de como ficou sabendo dos fatos antes de transformá-los em uma narrativa mais elaborada. Entendido desse modo, “O Paço das Freiras” pode ser comparado com um outro plano para a composição da novela (conservado no espólio do autor), este bem mais reduzido, em que constam apenas os nomes das partes que ela teria – dez partes, quase todas designadas por uma indicação espacial presente também no texto incompleto: «Lisboa» (os fatos anotados no segundo e terceiro parágrafos do texto), «Outra Lisboa» (quarto parágrafo), «Lisboa ainda» (quinto), «Correspondência das Ilhas» (sexto), «O Boletim», «Visita ao Paço» (sétimo), «Viseu» (oitavo), «Correspondência do Gerez» (nono), «Lisboa» (décimo) e finalmente «Outra Lisboa» (décimo-primeiro parágrafo).

Todos esses dados podem explicar o fato de Sena dizer a Vergílio Ferreira que começara a escrever «uma longa novela planejada há anos»: a história dos açorianos era mesmo uma obra planejada havia pelo menos dois anos. Se admitirmos então que Sinais de fogo começou por ser a novela O Paço das Freiras, a análise das páginas iniciais do manuscrito do romance pode revelar como esta foi gradativamente se transformando naquele.

O manuscrito é composto por 369 compactas páginas datilografadas, praticamente sem margens; o texto é um fluxo contínuo, quase sem correções. A primeira particularidade que chama a atenção é o fato de a primeira página do manuscrito trazer o número 4 escrito à mão, no canto superior direito, e as duas páginas seguintes trazerem os números 2 e 3, respectivamente, escritos à máquina, sobre os quais estão anotados à mão os números 5 e 6; a partir da página 7, a numeração é regular, à máquina. Isto significa que Sena começou a datilografar o texto de forma regular, numerando as páginas, e, ao chegar à terceira, mudou a paginação: terá mudado porque resolvera acrescentar três páginas antes da primeira. Se a obra começou por ser O Paço das Freiras, então as páginas acrescidas são três folhas datilografadas (também conservadas no espólio do autor), que trazem no alto da primeira, anotada à mão, a indicação: «Prólogo (a suprimir ou alterar)». É possível que Sena, logo depois de começar a obra, tenha achado que ela deveria ter um prólogo; interrompeu-a e escreveu-o; mudou a paginação das primeiras folhas em função do prólogo, e continuou a escrever a planejada novela.

Este prólogo é curioso por vários motivos. Primeiramente porque se inicia retomando uma reflexão que havia sido esboçada nos últimos parágrafos do primeiro texto dedicado a “O Paço das Freiras”: a partir da metáfora do puzzle, ambos desenvolvem basicamente as mesmas idéias sobre o modo de contar uma história de que se teve notícia (e mesmo de que se foi participante, ainda que secundário). A seqüência do prólogo é um resumo dos tais fatos, em inúmeros aspectos, e mesmo na escolha de palavras e frases, igual ao do fragmento de 1962/63. No entanto, não parece ser cópia ou adaptação dele, seja porque a história certamente «assombrava» o escritor a ponto de já ser uma cosa mentale passível de ser vazada em textos semelhantes, mesmo que separados no tempo; seja porque não só suprime certos detalhes como também acrescenta outros significativos [13].

Mas a questão mais significativa aqui talvez seja esta: quem é o eu que se expressa no prólogo? O próprio Jorge de Sena, ou um narrador autodiegético que, antes de fazer sua narração (isto é, de cumprir o seu papel tradicional), resolve expor-se diante do leitor, revelando o seu método de trabalho e questionando a sua eficácia e alcance? E isso porque seu texto resulta não de invenção, mas «de fatos e de memórias que, dos cantos vários de espaço, tempo, e pessoas, […] chegam tão fragmentados e variados pela distância, como pela visão dos que se recordam deles.» Em desespero de causa, o narrador (ou Jorge de Sena?) deixa que a imaginação aja «por conta própria», e dispõe-se a contar o que vai contar «à fé do que li e ouvi, ou do que eu próprio vi ou senti. O mais – que não é ponto de fé – cabe à imaginação: à minha, à dos outros, à do leitor também.» Ora, deixar que a imaginação trabalhe por conta própria não será transformar em ficção aquilo que foi, um dia, realidade? E haverá outra forma de não perder definitivamente aquilo que se viveu? O prólogo da falhada novela O Paço das Freiras parece ser, afinal, tão fictício quanto verdadeira é pretensamente a história que conta…[14]

Um outro aspecto que pode ajudar a confirmar a suposição de que se tratava inicialmente de O Paço das Freiras é que, na página 4 (a primeira do manuscrito), a designação «Parte primeira» surge ao alto, à máquina; logo abaixo, também centralizado, está riscado «Lisboa.»; por fim, o número do capítulo I está escrito à mão. Se levarmos em conta o plano das partes da novela, elas apresentariam as indicações espaciais e não haveria divisão em capítulos, que só passou a ser feita com a escrita já em curso. Outros detalhes do manuscrito parecem revelar a progressiva mudança que a obra foi sofrendo. Na página 13, o número do capítulo II está à máquina, o que, aliado ao fato do número do capítulo I estar escrito à mão, parece confirmar que, inicialmente, a narrativa só seria dividida em partes, sem subdivisão em capítulos. Na página 20, o número do capítulo III está anotado à mão, entre parágrafos sem separação; na página 27, o número do capítulo IV já aparece à máquina; na página 30, a designação «Parte segunda» está anotada à mão, ao fim do capítulo IV, e o número do capítulo V vem à máquina. Será muito difícil determinar a partir de que momento Sena percebeu que a narrativa afinal se desviava do projeto inicial, mas isso deve ter ocorrido logo de início, quando a história da crise do narrador assumiu um destaque maior. Já em 20 de janeiro de 1965, Sena dizia para Luís Amaro:

A verdade é que se me desencadeou um romance que creio estará terminado lá para Abril ou Maio (e que não é ainda o vasto romance cíclico há muito registado com o nome de Monte Cativo). Trata da minha geração nos anos 30 e 40 […]. Não é autobiográfico, mas toda a gente vai julgar que é. A hora da minha autobiografia ainda não soou.

Pouco tempo depois, em uma entrevista concedida a Alexandre Eulálio e publicada n’O Globo de 16 de fevereiro, a declaração do escritor acrescenta novas informações:

[…] estou trabalhando neste momento num magno romance sobre a evolução política e moral da minha geração, que começa com a Guerra de Espanha e termina com a bomba atômica. Já estou à página 200, mas penso que só agora atingi a metade do livro, que pretende ser ao mesmo tempo testemunho e documentário de uma geração, além do levantamento moral e ambiental de uma consciência em situação.

Fica claro que as férias de verão de 1964-65 foram dedicadas exaustivamente à escrita do romance: se, das 369 páginas do manuscrito, 200 já estavam escritas (e esse número será certamente um arredondamento), então Sena já saberia que não escrevia mais uma «longa novela», mas um «magno romance». É o que também aparece em cartas para José-Augusto França, de 3 de março de 1965 – «estou escrevendo um magno romance que pretende ser o retrato da minha geração, desde 1936 a 1959 (é uma das coisas que também agora me rouba tempo, pois que todos os dias escrevo umas páginas dele).» – e de 29 do mesmo mês e ano:

O meu romance já vai em 200 páginas como esta, e ainda não saiu do rebentar da guerra espanhola. De resto, este volume terminará com o desfile grandioso da MP [Mocidade Portuguesa], em Lisboa, no ano de 1937. Não sei se poderei publicá-lo. Aí [em Portugal], por certo, será impossível (até certo ponto). Aqui [no Brasil], […] é demasiado local (embora o não seja nos dramas individuais – além do narrador, neste volume agitam-se, em primeiro plano ou quase, umas trinta personagens).

Ao falar em «este volume», Sena deixa evidente que já pensava em desdobrar a obra em partes (como a Recherche de Proust). Em outra carta a Vergílio Ferreira, de 4 de julho do mesmo ano, Sena já fala em 300 páginas, o que indica que a escrita do romance avançou consideravelmente durante o primeiro semestre de 65: «O meu romance já orça pelas trezentas páginas como esta, e falta-lhe só a última parte (mais uma metade daquilo). Este primeiro volume trata da vida portuguesa, vista através de um narrador (que todo o mundo vai dizer que sou eu e não sou), desde o estalar da guerra de Espanha até ao grande desfile de 28 de Maio de 1937.»

A conformação definitiva que o romance possui foi progressivamente se estabelecendo como que à revelia das intenções, iniciais ou posteriores, do autor: por certo a narrativa foi passando por uma espécie de «concentração temporal» durante sua composição, sobretudo nas partes centrais, e Sena percebia que a narrativa não avançaria até 1959, como dissera a José-Augusto França, e nem até 1945, como havia afirmado a Alexandre Eulálio; ao menos não avançaria dentro dos limites de apenas um romance, ainda que volumoso: em julho, Sinais de fogo já é um «infindável romance» (carta para António Gedeão, 10 de julho de 1965), uma saga que seu autor pensa em repartir por diversos volumes.

No princípio de outubro, Jorge de Sena transferiu-se de Araraquara para Madison, nos Estados Unidos, onde foi ser visiting professor na Universidade do Wisconsin (em 1967, seria nomeado full professor with tenure). É evidente que uma mudança transcontinental de uma família de onze pessoas, além das novas e várias obrigações que o escritor e professor assumia, teria como conseqüência a suspensão de um ou mais trabalhos: foi o que aconteceu com o romance. No final do ano, diz ao amigo José Blanc de Portugal: «Estou à espera de repouso para prosseguir na composição do meu terrífico romance» (12 de novembro de 1965).

Não podemos esquecer que, com a mudança para a América do Norte em outubro, Sena passou um ano e meio sem férias de verão, que eram fundamentalmente o período do ano em que podia dedicar-se com mais tempo à escrita do romance. De fato, durante o primeiro semestre de 1966 tudo ficou suspenso: «Todo o tempo livre tem sido para o meu trabalho pessoal (ainda não tive tempo de pegar no meu romance, calcule), as provas dos livros, algumas leituras, uma carta inadiável de negócios.» (Carta para Sarmento Pimentel, 9 de abril de 1966); «sinto-me muito cansado, e muito frustrado de falta de tempo para obra própria, no que à frente está o meu romance dificilmente publicável […], cujo primeiro volume está à espera de que eu lhe faça a terceira e última parte.» (Carta para Sophia de Mello Breyner Andresen, 21 de maio de 1966). Foi só em julho que pôde retomá-lo: «Recebi o livro do Faure da Rosa. Mas, assoberbado com o trabalho escolar do curso de verão, com a prosa do Colóquio, a do Ocidente, e com o meu romance que enfim recomecei, não estou de apetite para leituras por enquanto.» (Carta para Adolfo Casais Monteiro, 17 de julho de 1966)

A referência ao romance na carta para Sophia de Mello Breyner Andresen traz uma curiosa confusão do escritor: a última parte do romance não é a terceira, mas a quinta, e é pouco provável que o manuscrito estivesse interrompido ao final da «Parte segunda», o que daria menos de um terço da obra, longe das 300 páginas já escritas em 1965 (Cf. carta para José Rodrigues Miguéis, 13 de setembro de 1965: «E aqui comigo ainda tenho mais um livro de contos […], dois volumes de poemas, um de teatro, outro de ensaios e trezentas páginas de um quilométrico romance»).

Segundo Mécia de Sena, o que ajuda a perceber em que ponto Sena parou a escrita do romance em Araraquara, antes de retomá-la no Wisconsin, é o tamanho das folhas de papel que usava: folhas grandes no Brasil, folhas menores nos Estados Unidos. No manuscrito, as folhas grandes vão até a página 301. Mas há uma particularidade interessante: as primeiras páginas do manuscrito que se encontra em Santa Barbara [15] estão manchadas no alto (um pouco à esquerda, um pouco no centro, mais à direita), manchas que vão desaparecendo e praticamente somem a partir da página 25; voltam a aparecer na página 265, e acentuam-se até a 289, que é o fim do capítulo XXXVI e da «Parte quarta»; a página 290 (início da «Parte quinta») já não apresenta mancha nenhuma. Além disso, as folhas das páginas 290 a 301 são ligeiramente maiores do que as anteriores. Na falta de dados concretos sobre a continuação da escrita, podemos imaginar algumas hipóteses para o estado do manuscrito e a interrupção da escrita:

1. Sena teria interrompido o romance no final da «Parte quarta», e retomado depois para iniciar a «Parte quinta»; o manuscrito levado do Brasil teria 289 páginas (pouco mais ou menos), que se teriam manchado devido a algum imprevisto, entre os muitos que certamente devem ter ocorrido durante a mudança da família e dos seus respectivos pertences, entre os quais constavam uma imensa biblioteca e incontáveis papéis avulsos.

2. Mas também é plausível pensar que o manuscrito levado do Brasil chegava até a página 301, e que as últimas precisaram ser refeitas [16], seja porque estivessem muito manchadas, seja porque a interrupção tenha sido muito abrupta, e para retomar o fluxo narrativo Sena precisasse recuar um pouco.

3. E ainda há que se considerar o fato de Sena ter emprestado a cópia do manuscrito a Adolfo Casais Monteiro antes de ir para os Estados Unidos, e ter levado consigo apenas o original [17]; essa cópia só retornou às mãos do escritor em 1975. É possível que o manuscrito manchado seja a cópia, e que as últimas páginas tenham sido datilografadas novamente antes que ele fosse remontado com o que entretanto havia sido escrito.

Seja qual for a explicação, a interrupção deve ter-se dado por volta da página 300 do manuscrito, como indica a carta a Vergílio Ferreira de 4 de julho de 1965, o que significa dizer que cerca de 80% do romance foi escrito em Araraquara. Ou seja, é o início do capítulo XXXVIII, o segundo da «Parte quinta», que talvez tenha sido abruptamente interrompido e depois refeito. Se foi realmente isso que aconteceu, então a confusão na carta para Sophia de Mello Breyner Andresen é perfeitamente compreensível: apesar de estruturado em cinco partes, Sinais de fogo se apresenta nitidamente como um tríptico, ou melhor um duplo tríptico, em mise en abyme, pois as três partes centrais (segunda, terceira e quarta) formam um conjunto – os dias na Figueira da Foz – em vários aspectos separado da primeira e da última, que se passam predominantemente em Lisboa; dessa forma, a estrutura pode ser entendida como tripartite, com a parte central também dividida em três.

Assim, em julho de 1966, Sena retoma o romance, interrompido talvez no início da «Parte quinta», para concluir essa última parte. Um esquema manuscrito das três partes centrais, que se encontra no espólio do autor, pode ter sido feito já nos Estados Unidos, quando Sena foi retomar o trabalho: releu e esquematizou o que já estava escrito, depois de um ano e meio de interrupção, para poder continuar a obra com mais segurança. Mas é possível que o verão de 1966 não tenha sido muito proveitoso, devido às inúmeras atividades desgastantes que o escritor desenvolveu no segundo semestre, e que várias cartas descrevem, como, por exemplo, uma de 17 de agosto, para Taborda de Vasconcelos:

Quero que compreenda que o meu silêncio agora nada mais significou do que a minha vida dos últimos anos: aulas, trabalho de pesquisa, viagens, a adaptação de uma família numerosa como a minha a um país cuja cultura e língua lhe não eram familiares […], livros e artigos, provas de exame e tipografia, e, nos últimos dois anos, uma saúde precária sem tempo nem dinheiro para o luxo de ser tratada.

Por outro lado, o final do romance não parecia próximo, e a sua continuação em outros volumes já era certa – é o que foi dito a José Rodrigues Miguéis, em 8 de janeiro de 1967:

[…] eu tenho dois livros de poemas para publicar, um livro de contos […], um romance de 300 páginas (que quero acabar agora com mais umas 200, calculo, e que será o primeiro volume de uma série – só que não é possível publicá-lo em Lisboa, pois que, pelos padrões de reticência realista e política locais, e mesmo não-locais, é de uma violência tremenda) […].

É para Eduardo Lourenço, em carta de 8 de junho de 1967, que pela primeira vez Sena nomeia o romance que está escrevendo: «Pior será se eu publicar o romance que estou concluindo (um primeiro volume), em que historio romanescamente a nossa evolução espiritual e política desde 1936 a 1959. Não sei se terei vida para concluir esse plano gigantesco. Mas espero concluir neste verão aquele volume, Sinais de fogo, que é só 1936 e a guerra de Espanha.» Mas há uma indicação anterior: na lista de obras do autor publicada na primeira edição de Uma canção de Camões (impressa em janeiro de 1966), aparecem entre aquelas «no prelo ou em preparação»: «Sinais de fogo, romance./ Monte Cativo, romance.» O mesmo acontece na primeira edição das Novas andanças do demónio (agosto de 1966) e na d’Os sonetos de Camões e o soneto quinhentista peninsular (janeiro de 1969).

O verão de 1967 parece ter sido seguramente o período em que Sena pôde retomar um pouco mais longamente a escrita do romance. Em 2 de agosto, escreve para Luís Amaro:

E, quando me preparava para retomar as pesquisas […] em curso, desabou-me violentamente em cima o romance que estava quieto havia séculos, e afinal à espera de uma aberta por onde enfiar-se – estou, neste momento em que tirei da máquina uma página pronta, para pôr esta carta, no comício do Campo Pequeno, cuja data exata em tempos V. fez o favor de descobrir-me e que acerta perfeita com o desenvolver da ação do romance. «Estou no comício» é uma maneira de dizer, porque nem eu nem as minhas personagens põem os pés nessas coisas…

No romance, a referência ao comício é feita no início do capítulo XL, que corresponde à página 314 do manuscrito: desde que chegara aos Estados Unidos, quase dois anos antes, Sena teria escrito pouco mais de 10 ou 15 páginas, o que é bastante exíguo se comparado à «avalanche» de 300 páginas escritas no Brasil.

A carta em que Luís Amaro informa Jorge de Sena sobre a data do comício no Campo Pequeno (ocorrido em 28 de agosto de 1936), entre outros dados históricos, é de 26 de dezembro de 1965, a que o escritor agradece a 14 de fevereiro de 1966, dizendo que «para o [seu] romance […], a data da tourada-comício era decisiva.» Isso demonstra mais uma vez como o seniano processo mental de composição se dava: a elaboração interior contínua não o afastava do que era historicamente significativo para sua obra (e como isso «acerta[va] perfeita com o desenvolver da ação do romance»), e sempre tinha o seu devido tempo de maturação, conforme é dito para Dante Moreira Leite (21 de agosto de 1967): «Quanto a trabalho meu, o romance tem continuado animadamente, e apenas o suspendi em crise de consciência (e também porque cheguei a um passo que quero que amadureça no subconsciente primeiro ou lá onde é que isso acontece) para tratar do padre António Vieira […].»

Com o início do ano letivo (1967-68), o romance sofreu nova interrupção, até as férias seguintes: «Pressionado pelo meu volume (o 2º) daqueles estudos intermináveis que estou publicando em Lisboa, […] não posso por enquanto retomar de novo o romance, em que, se não deponho esperanças, deponho pelo menos o gosto de escrevê-lo, o que já não é mau.» (Carta para Dante Moreira Leite, 18 de novembro de 1967);

O romance (outro que não o projetado e iniciado há muitos anos) que estou a escrever há três anos (e que está neste momento parado a p. 400 do original, por falta de tempo livre para retomá-lo desde o verão) […] começa por analisar os efeitos da guerra civil espanhola na minha geração, além de ser a coisa moralmente e sexualmente mais franca e brutal que já se escreveu em português… (Carta para Vasco Miranda, 4 de janeiro de 1968)

As 400 páginas referidas na carta a Vasco Miranda são sem dúvida um número arredondado, mas podem indicar que durante o verão de 1967 Sena tenha escrito mais do que as 10 ou 15 páginas sugeridas acima. Em todo caso, a escrita é evidentemente lenta: para Fernando Lemos, Sena diz que sonha «com algum tempo para continuar a escrever» e informa que «o romance, com a falta de tempo, tem marchado a passo de boi» (carta de 4 de abril de 1968).
Mas nesse momento, parece já estar delineado o plano geral tanto do volume como de todo o ciclo romanesco, faltando apenas a identificação com o planejado Monte Cativo, que se dará um pouco mais adiante. A organização do ciclo (que será a incompletamente definitiva) vem explicitada na entrevista que Sena concedeu a Arnaldo Saraiva em 1968:

Quanto à ficção, estou absorvido com a conclusão de um romance, Sinais de fogo, primeira parte de um vasto ciclo que não sei se chegarei a escrever. Este volume, de que estão escritas 400 páginas, trata apenas de alguns meses de 1936; e o plano geral do ciclo pretende cobrir, através das experiências de um narrador, a vida portuguesa desde 1936 a 1959. […] é, como os contos inéditos de Os grão-capitães, um livro de uma franqueza total que não recua perante coisa alguma. Não é, porém, nem ainda, as minhas «confissões de Jean Jacques Rousseau». (Saraiva, 1968, p. 424)[18]

Essa entrevista foi publicada em um número especial da revista O Tempo e o Modo, dedicado quase integralmente ao autor. Para ilustrar a sua produção literária, Sena escolheu, entre outros textos, trechos do romance, especificamente aqueles em que Jorge escreve poemas, que receberam o título geral de “Aparição da poesia”: são partes dos capítulos X, XXXVII, XXXVIII e XLI (no caso deste último, o trecho escolhido vai até o final do capítulo). Isso permite dizer com segurança que, no início de 1968 (o número da revista é de abril), o manuscrito já havia chegado à página 352, faltando apenas 17 páginas para ficar definitivamente suspenso.

Em 1968, as referências à retomada do romance são escassas e ambíguas, como nessa carta a Eduardo Lourenço, de 29 de junho: «o supracitado romance, […] não sei se lhe disse, se passa todo em alguns meses de 1936 (precisamente neste momento estou, após centenas e centenas de páginas, à beira da revolta dita dos barcos, em Setembro desse ano).» Não é possível determinar se o manuscrito estava interrompido neste ponto desde o ano anterior, ou se a escrita prosseguira por essa época. A referência explícita à «revolta dos barcos» aparece no último capítulo (XLIII), mas já se anuncia desde o capítulo XLI (que certamente estava concluído). Se o escritor avançara até o capítulo XL em 1967, terá escrito em torno de 20 páginas em 1968.
Além disso, as férias deste ano terão sido de preparação para a primeira viagem de regresso à Europa depois de nove anos de exílio, realizada entre setembro de 1968 e fevereiro de 1969: graças a uma bolsa da Fundação Gulbenkian e a uma licença da Universidade do Wisconsin, Sena pode fazer investigações e conferências em vários países europeus e finalmente retornar a Portugal.

Nas férias de 1969, retomou (e talvez pela última vez) a escrita do romance: «Após concluir aqueles trabalhos, voltei às minhas pesquisas camonianas e circunvizinhas, ao meu romance, e afanosamente, na maior parte do dia, à preparação da edição revista das Líricas Portuguesas» (carta a Eugénio de Andrade, 16 de junho); «Tenho revisto também os meus contos inéditos, do volume Os grão-capitães, e retomei o romance interrompido» (carta para Eduardo Lourenço, 18 de junho).

Alguns dias depois, Sena escreveu para Luís Amaro (carta de 6 de julho de 1969), pedindo novamente informações necessárias ao desenrolar da ação do romance:

E um outro favor lhe peço, de que depende agora o avanço do meu romance, com que às vezes me repouso do cansaço e da exaustão em que vivo, sem poder nem saber parar. Ponha nisso a sua paciência e a sua boa vontade. No dia 8 de setembro de 1936, houve a chamada «revolta dos barcos» que foram afundados. Isso aconteceu de noite e numa madrugada – na de 7 para 8, ou na de 8 para 9? Quais foram os barcos que se revoltaram? Quais foram afundados ou semi-destruídos? O que é que os jornais disseram? E em que dia? Uma fotocópia de um Século ou de uma Notícia seria o ideal, para eu poder usar frases da notícia.

Isso significa que Sena estaria, nesse momento, a escrever ou terminar o capítulo XLII, ou até a iniciar o capítulo XLIII, que ficou sendo o derradeiro. Luís Amaro enviou-lhe as informações uma semana depois [19]. Acabadas as férias, o romance ficou novamente em estado de suspensão: «E não andam outros estudos que tenho em mãos nem o romance que nunca mais acabo.» (Carta a José Blanc de Portugal, 28 de novembro de 1969).

As férias do ano seguinte (1970) foram ocupadas com a mudança para Santa Barbara, Califórnia, ocorrida em agosto. As variadas ocupações e a falta de tempo continuavam a angustiar o escritor: «Parece-me que, desta vez, me deixo submeter à pressão editorial para publicar os meus contos de Os grão-capitães (menos um par impossível…), dois dos quais apareceram em O Tempo e o Modo. Mas, de tudo isto, e do mais que tenho pendente, o que eu queria era tempo para acabar de uma vez o meu romance.» (Carta para Rui Knopfli, 4 de janeiro de 1971)

A impossibilidade em obter as informações de que precisava também era um empecilho para a continuação da obra: «O meu [romance], que avançou mais um pedaço, está parado, porque preciso de ver – e não tive tempo em Lisboa há dois anos – os jornais daquele tempo, para dar uma atmosfera exacta para as sequências finais.» (Carta para Adolfo Casais Monteiro, 18 de março de 1971)

De fato, na segunda viagem à Europa, realizada entre junho e setembro de 1971, Sena aproveitou para fazer pesquisas na Biblioteca Nacional. No espólio do escritor, estão conservados dois blocos de apontamentos, inteiramente preenchidos com notas manuscritas de informações históricas, pesquisadas no Diário de Notícias de Lisboa. A primeira página do primeiro bloco começa no dia 2 de agosto (de 1936), a última do segundo acaba em 31 de dezembro.
Arnaldo Saraiva, na introdução que fez para a 1ª edição de Sinais de fogo, diz que essas notas foram feitas quando da viagem de 1968-69, e parte do princípio de que as informações colhidas por Luís Amaro na folha solta que está na pasta do espólio dedicada ao romance são anteriores a esta pesquisa (Cf. Sena, 1979, p. 11). Mas, como ficou demonstrado, a folha de Amaro é de 15 de julho de 1969, e Sena não pediria as informações que pede se tivesse os apontamentos desses blocos. Foram feitos, portanto, posteriormente.

Durante a viagem à Europa em 1971, o escritor esteve durante o mês de agosto e o início de setembro em Lisboa; as cartas a Mécia de Sena documentam detalhadamente o que ele fez nesse período. Em carta de Lisboa, datada de 6-7-8-9 de agosto de 1971, lê-se: «Reatei a carta, depois de ter saído de manhã para encontrar-me com o Amaro na B. Nacional […], aonde depois o apresentei ao Cattaneo. Comecei já a repassar os jornais de 36-37, por causa do final do meu romance […].» E em outra carta, ainda de Lisboa, datada de 11 de agosto: «São 5 e meia da tarde, trabalhei desde que deitei carta ao correio para ti, depois de ter tirado a radiografia, até às 3 da tarde, na B. Nacional (o D. Not. de 36 por causa do romance está espiolhado já) […].» Depois desse dia, não há mais referências a pesquisas na Biblioteca Nacional, Sena talvez não tenha voltado lá devido a uma série de (des)encontros e contratempos. Isso quer dizer que os apontamentos foram feitos nos dias 7 e 11 de agosto de 1971, mas não terão tido a utilidade esperada, já que, ao regressar aos Estados Unidos em setembro, o escritor precisou retomar suas atividades na Universidade.

Em 1972, ano do IV centenário d’Os Lusíadas, além de dirigir o Programa de Literatura Comparada da UCSB, Sena dedicou-se a várias conferências sobre Camões, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa (duas viagens, em março e entre junho e setembro) e na África (onde esteve entre julho e agosto); em 1973 e 1974, fez novas viagens longas à Europa. Em 1975, ensinou Literatura Portuguesa na UCLA, durante o segundo quarter (ou seja, o segundo trimestre letivo, que começava em janeiro, isso porque a Universidade da Califórnia, nessa altura, funcionava em regime trimestral), acumulando com as aulas em Santa Barbara, em virtude do falecimento do professor titular, Machado da Rosa; e passou a dirigir, no final do terceiro quarter (a partir de junho), o Departamento de Espanhol e Português da UCSB e o Programa Interdepartamental de Literatura Comparada. Em março de 1976, sofreu um ataque cardíaco, mas pôde ainda viajar a Portugal e Itália, em setembro, e também no primeiro semestre do ano seguinte.

Durante todo esse período, não aparecem na correspondência novas referências ao romance, o que pode indicar que Sena não teve mais tempo para retomá-lo. Em 1976, em entrevista concedida a Valentim Lemos e publicada no jornal lisboeta O Dia de 20 de setembro, a preocupação em terminar Sinais de fogo ainda é evidente: «Falando de novos trabalhos, tenho vários. […] Estou também a ver se termino um romance, um romance bastante vasto (Sinais de fogo) que já há muito tempo estou a escrever.» E em outra entrevista, concedida a Ignácio Moneo e publicada em um jornal de Salamanca, El Adelanto, de 21 de maio de 1977, o final do romance parece premonitoriamente distante e impossível: «Estou escrevendo há muitos anos um vasto romance, que não sei quando acabará, creio que não acabará nunca.» E não acabou, porque pouco mais de um ano depois, a 4 de junho de 1978, Jorge de Sena morria.
Mas o escritor ainda teve tempo de apontar o vínculo entre Sinais de fogo e o projeto do ciclo romanesco Monte Cativo. Em 1977, ao preparar as notas aos contos de Andanças do demónio a serem incluídas na reedição conjunta Antigas e novas andanças do demónio, lembrou-se de dizer, referindo-se a “A Campanha da Rússia”: «Este texto de 1946, revisto em 1960, havia sido concebido como um dos finais de volume da imensa ‘suma’ romanesca, Monte Cativo, cujo primeiro tomo, Sinais de fogo (extratos do qual apareceram em O Tempo e o Modo, n° 59, Abril de 1968), se encontra em vias de conclusão.» (Sena, 1981, p. 218) [20]

Em suma, a composição de Sinais de fogo estendeu-se de 1964 a, no máximo, 1970, sendo que 80% da obra foi escrito entre novembro de 1964 e julho de 1965. Durante esse período, a dedicação do escritor ao romance foi intensa, e deve ter absorvido consideravelmente sua capacidade de criação [21] – é sintomático o fato de Sena não ter escrito, no primeiro semestre de 1965, senão os Sete sonetos da visão perpétua, o primeiro no dia 24, os outros no dia 25 de fevereiro; antes, escrevera apenas dois poemas, em dezembro de 1964, inspirados por Debussy: “‘Festas’, de Debussy” (no dia 6) e “‘La cathédrale engloutie’, de Debussy” (no dia 31), este motivado certamente pela «aparição da poesia» no romance; e um poema, em novembro: “Missa solene op. 123, de Beethoven” (no dia 2).

Isto tudo quer dizer que a abordagem de Sinais de fogo deve sempre levar em conta a «decalagem» entre o momento da escrita (anos 1960) e o momento da publicação (1979), consideração que, se desprezada, pode provocar (como já provocou) não tanto desvios de interpretação, mas de avaliação. Nesse sentido, acontece com Sinais de fogo o mesmo que aconteceu com Nome de guerra, cuja inovação, relacionada com o momento da escrita (1925), passou praticamente despercebida no momento da publicação (1938), época já das disputas entre presencistas e neo-realistas. Sinais de fogo deve ser analisado como romance dos anos 1960, e considerado em relação a outras obras dessa época.

E também como Nome de guerra e A personagem total, Sinais de fogo são um «romance de aprendizagem», segundo a tipologia de Lukács. Da mesma forma que, no romance de Almada, a aprendizagem é um «desvelamento do herói, feito através da descoberta da própria intimidade» (Gomes, 1998, p. 127), também o romance de Sena promove um desvelamento da realidade – mas, neste caso, uma realidade tanto individual quanto coletiva, uma luta incessante na busca de um sentido possível para uma realidade sem-sentido, feita de mentiras, de convenções, de velhos preceitos e preconceitos que precisam ser denunciados (semelhantes àqueles contra os quais Antunes, o protagonista da obra de Almada, tem de bater-se).

 

Notas:

13. O mais importante deles é, sem dúvida, o que justifica a parte intitulada «O Boletim» na divisão em partes da novela, e que não constava do primeiro “Paço das Freiras”.
14. Este prólogo apareceu na primeira edição do romance (1979, p. 17-21), mas foi suprimido nas seguintes, porque, afinal, realmente não pertence aos Sinais de fogo.
15. Na verdade, trata-se de uma fotocópia do manuscrito, pois os originais de obras já publicadas são sistematicamente enviados por Mécia de Sena para a Fundação Calouste Gulbenkian, que é a depositária oficial de todo o espólio de Jorge de Sena.
16. Mécia de Sena fala no «refazimento de duas meias páginas», quando afirma que a escrita ficara suspensa na página 301 (“Introdução”, em Sena, 1997, p. 19).
17. Desde 1962, quando não pôde mais contar com a esposa para secretariá-lo, Sena escrevia diretamente à máquina praticamente tudo o que não fosse poesia, sempre em duas vias (original e cópia).
18. Em outra entrevista, de janeiro de 1969, o autor parece transferir o título do romance para o ciclo: «estou a concluir (já vai em 600 páginas) o 1° volume de uma vasta suma romanesca: Sinais de fogo» (Jornal de Notícias, Porto, 23/01/1969), mas deve ser apenas problema de construção sintática. Ao falar em 600 páginas, Sena certamente estaria pensando no livro já editado.
19. Cf. carta de Luís Amaro, de 16 de julho: «Ontem escrevi-lhe a enviar o que pude ‘investigar’, rapidamente (só os títulos) sobre o caso da revolta da Marinha. Se dispusesse da tarde inteira, poderia ter copiado mais coisas.» A folha com os títulos dos jornais e outros dados encontra-se no espólio do escritor, em uma pasta dedicada ao material relativo a Sinais de fogo. É de referir que Sena, no último capítulo, aproveita literalmente um parágrafo do que Luís Amaro copiou do Diário de Notícias.
20. Uma indicação nesse sentido aparecera já na lista de obras do autor presente na edição de Francisco de la Torre e D. João de Almeida (publicado em junho de 1974): entre as obras «no prelo ou em preparação», está «Sinais de fogo (Monte Cativo-I), romance» (Sena, 1974, [337]).
21. Cf.: «No fim de 1964, comecei a escrever o romance Sinais de fogo, em que no ano seguinte, toda a minha capacidade de ficção se concentrou.» (Sena, 1989a, p. 16).

 


Referências bibliográficas

ANDRESEN, S. M. B.; SENA, J. Correspondência (1959-1978). Ed. de M. de Sena. 2ª ed. Lisboa: Guerra & Paz, 2006.
FAGUNDES, F. C. “Eros na ilha de fascistas: ‘A Grã-Canária’ como paródia da ilha dos amores de Camões”. In: –––––. Metamorfoses do amor. Lisboa: Salamandra, 1999, p. 149-82.
GOMES, A. C. “A aprendizagem de desaprender”. Colóquio/Letras, n. 149/150, p. 123-128. Lisboa, jul.-dez. 1998.
LOURENÇO, E.; SENA, J. de. Correspondência. Ed. e intr. de M. de Sena. Intr. de E. Lourenço. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1991.
LOURENÇO, J. F. O essencial sobre Jorge de Sena. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1987.
–––––––––––––––. “Um convite à efabulação: sobre Monte Cativo e outros projectos de ficção, de Jorge de Sena”. Colóquio/Letras, n. 142, p. 214-217, out./dez. 1996.
MACEDO, H. “A Grã-Canária e a ilha do Amor”. In: PICCHIO, L. S. Jorge de Sena, n. esp. de Quaderni portoghesi, n. 13/14, p. 167-74, 1983.
MANN, T. A gênese do Doutor Fausto: romance sobre um romance. Trad. de R. F. Henrique. São Paulo: Mandarim, 2001.
MOREIRA LEITE, D.; SENA, J. de. Correspondência: registros de uma convivência intelectual. Campinas: Ed. da Unicamp, 1996.
SARAIVA, A. “Falando com Jorge de Sena”. In: COSTA, J. B. (ed.). Jorge de Sena. Nº esp. de O Tempo e o Modo, n. 59, p. 409-430, abril de 1968.
SENA, J. de. Antigas e novas andanças do demónio. 2ª ed. Lisboa: Edições 70, 1981.
––––––––––. Diários. Ed. e intr. de M. de Sena. Porto: Caixotim, 2004.
––––––––––. Francisco de la Torre e D. João de Almeida. Paris: Fundação Calouste Gulbenkian/Centro Cultural Português, 1974.
––––––––––. Génesis. Ed. e intr. de M. de Sena. 2ª ed. Lisboa: Edições 70, 1986a.
––––––––––. Os grão-capitães; uma seqüência de contos. 5ª ed. Lisboa: Edições 70, 1989a.
––––––––––. O indesejado (António, rei); tragédia em quatro actos, em verso. Porto: Cadernos das nove musas/“Portucale”, 1949 [1951].
––––––––––. Monte Cativo e outros projectos de ficção. Ed. e intr. de M. de Sena. Porto: Asa, 1994.
––––––––––. Post-scriptum-II. Ed. e intr. de M. de Sena. Lisboa: Moraes/Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1985. 2 vols.
––––––––––. O reino da estupidez-I. 3ª ed. Lisboa: Edições 70, 1984.
––––––––––. Sinais de fogo. Intr. de A. Saraiva. Lisboa: Edições 70, 1979.
––––––––––. Sinais de fogo: Monte Cativo – I. 7ª ed. Intr. de M. de Sena. Porto: Asa, 1997.
––––––––––. Visão perpétua. Ed. e intr. de M. de Sena. 2ª ed. ampl. Lisboa: Edições 70, 1989b.
––––––––––; CASTILHO, G. de. Correspondência. Ed. e intr. de M. de Sena. Intr. de G. de Castilho. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1981.
––––––––––; FERREIRA, V. Correspondência. Ed. e intr. de M. de Sena. Intr. de V. Ferreira. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1987.
––––––––––; FRANÇA, J.-A. Correspondência (1948-1978). Ed. de M. de Sena. Intr. de J.-A. França. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 2007.
––––––––––; RÉGIO, J. Correspondência. Ed. e intr. de M. de Sena. Intr. de J. A. R. Pereira. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1986b.
SENA, M. de; SENA, J. de. Isto tudo que nos rodeia (cartas de amor). Ed. de M. de Sena. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1982.
VASCONCELOS, T. de. Correspondência arquivada. Porto: edição do autor, 1987.