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Jorge de Sena – escritor português, cidadão brasileiro (Estudo das relações Brasil-Portugal)

Eu invejo sinceramente os escritores-turistas, aqueles que são capazes de visitar um país que nunca viram e de que quase nunca ouviram senão generalidades, cuja língua não falam, cuja população não contactam, de cujos problemas não inquirem, e que, no entanto, regressados de uma estadia de quinze dias nos hotéis de luxo – iguais em todo o mundo, e com o mesmo ‘pudim caramel’ – e de vários sobrevoos por entre as nuvens que cobrem um país de escala continental, opinam com a ligeireza encantadora  e  com deliciosa  ou  ponderosa irresponsabilidade. E os leitores de boa-fé acreditam. (Sena 1988: 95).

Contra a opinião ‘ligeira’ e  ‘irresponsável’, tanto em relação à análise da realidade
social de determinado espaço quanto aos mais diversos aspectos culturais, é que o escritor
português Jorge de Sena lutou, exercendo uma rigorosa e contínua atividade crítica. Por
oposição ao regime salazarista em Portugal, exilou-se no Brasil, no período de 1959 a 1965 (1),
vindo a  realizar aí  seu projeto há muito acalentado de uma carreira docente em Letras e parte
de sua obra, em que se destacam (2) o livro de poesia  Metamorfoses, seguidas de quatro
sonetos a Afrodite Anadiómena
(publicado em Lisboa, 1963) e obras críticas como O poeta é
um fingidor
e O reino da estupidez I (ambos publicados em 1961, também em Lisboa), para
além de diversos e fundamentais estudos sobre a obra camoniana (3) e sobre as literaturas
brasileira e portuguesa, que seriam publicados em livros a partir de 1966, já vivendo nos
Estado Unidos. Nesse terceiro espaço de sua vida, onde viria a falecer em 1978, foi professor
visitante e depois professor catedrático do Departamento de Espanhol e Português  da
Universidade de Wisconsin. Mais tarde, mudou-se para a Universidade da Califórnia (Santa
Barbara) da qual foi também professor catedrático do Departamento de Espanhol e Português,
como descreve Lisboa (1979:15).

Frente a esse homem de cultura e apaixonado analista da cultura de língua
portuguesa, com uma obra tão extensa, provocativa e de irretocável valor, interessa-nos
apontar algumas pertinentes considerações senianas sobre as relações literárias luso-
brasileiras, discutindo agudamente os impasses entre Portugal e Brasil, dois países ligados
pela mesma língua e por uma História partilhada (4), no entanto, tantas vezes tão desconhecidos
entre si.

Fora de ter sido um verdadeiro intelectual entre dois mundos (5), podemos afirmar que
Sena, em seus muitos estudos e ensaios, desenvolveu particular método de análise que
consistia em penetrante ‘dialética interpretativa’, jamais satisfeita com os resultados obtidos,
jamais acomodada diante das  ‘verdades’ dominantes. O seu conceito de cultura definia-se por
uma tríplice exigência constante e irrevogável de ‘dúvida metódica, juízo analítico, visão
sintética’ (Sena 1971a: 179). Com essa perspectiva, compreende-se como esse escritor
português, que se tornou cidadão brasileiro (naturalizado em 1963),  realizou estudos
importantes sobre a cultura brasileira, os quais continuam praticamente ignorados pelos
estudiosos da área. Por isso, é contra o desconhecimento dessa contribuição crítica que este
trabalho se configura (6), buscando apresentar como Jorge de Sena vivenciou a realidade
brasileira e sobre ela escreveu em diversos momentos, analisando diversos pontos complexos
da relação Brasil – Portugal.


Um itinerário crítico: a problematização das leituras do império e de Camões pelo
Estado Novo

O aparato crítico seniano não surgiu no vácuo, e o próprio Sena seria o primeiro a
criticar qualquer pretensão de universalidade que escamoteasse sua origem. Toda  a pretensão
de universalidade provém de um lugar, já nos ensinou o filósofo francês Paul Ricoeur (2002).
A obra crítica seniana, assim como sua produção poética (que  tem como um de seus
objetivos principais transformar o mundo (7), compreendendo a poesia como um testemunho da
condição humana), foi concomitante ao surgimento, instauração e solidificação da ditadura de
Oliveira Salazar em Portugal (1926-1974), uma das mais longas do mundo ocidental.
Lembremos que em 1910 houve a implantação da República, a qual não conseguiu solucionar
os graves problemas sócio-político-econômicos que impediam o desenvolvimento do pequeno
país europeu. Afundado em crises políticas, revoltas internas, em 1926, houve a suspensão
das atividades do Parlamento e dava-se início à ditadura militar. Em 1928, O general
Carmona é eleito presidente da República e António de Oliveira Salazar, professor da
Universidade de Coimbra, é nomeado ministro das Finanças. Inicia-se  a trajetória salazarista
que viria a dominar completamente o poder por cerca de 50 anos (8).

Todo o poder procura legitimar-se, e não há nenhuma legitimação política que não re-
interprete a seu modo toda a História da nação, assim como todo o seu futuro. O problema,
cabe ressaltar, não está na legitimação em si, pois esta pode estar construída em bases reais; o
problema está na  deturpação de toda a história sócio-cultural, estratégia da qual,
particularmente, os diversos fascismos foram os maiores cultores. O Estado Novo português
impingiu uma imagem de Portugal como império católico e ocidental (que já subsistia de
diversas formas no ideário português, mas que alcançou, no período tratado, uma virulência
tirânica). Jorge de Sena não pôde deixar de se levantar contra as seguidas deturpações ora da
história, ora da literatura, assim como em oposição a  outras sem-razões ditatoriais.
Conseqüentemente, seu método crítico desenvolveu-se, primeiramente, contra uma forma
específica e perfidamente persuasiva de dominação cultural: o discurso salazarista com suas
estratégias de paternalismo, defesa nacional, glorificação do passado imperialista e da política
colonialista, saneamento público, moralismo cristão e ações repressivas (censura e controle
social) .

Sena devassa toda a construção idealizada pelo Estado Novo português, e uma das
principais imagens construídas era a de Camões como poeta da raça e do império, símbolo do
nacionalismo fascista português. O poeta do século XX solapa essa interpretação e instaura
outra, revelando, no corpo dos textos camonianos, um outro poeta. Assim, do Camões
renascentista, patriótico, etnocêntrico, colonizador e grandioso ao Camões maneirista,
exilado, libidinoso, dialético e derrotado, Jorge de Sena realizou profunda inversão
interpretativa da obra do poeta do século XVI, reavaliando a escrita camoniana na sua medida
humana e salvando-a, em certa medida, da exploração salazarista. Desse trabalho de
desconstrução de um mito é prova o magnífico poema ‘Camões na Ilha de Moçambique’,
datado de 20/07/1972, no qual relê Os Lusíadas como pequena história trágico-marítima
portuguesa e Camões como a síntese da grandeza/miserabilidade do homem comum. Nos seus
69 versos, toda essa história é revista como também Camões é trazido à medida humana,
renegando-se uma glória hipócrita e afirmando-se acima de tudo  sua condição original de
poeta, de homem no mundo.

[…]
Não é de bronze, louros na cabeça,
nem no escrever parnasos, que te vejo aqui.
Mas num recanto em cócoras marinhas,
soltando às ninfas que lambiam rochas
o quanto a fome e a glória da epopeia
em ti se digeriam. Pendendo para as pedras
teu membro se lembrava e estremecia
de recordar na brisa as croias mais as damas,
e versos de soneto perpassavam
junto de um cheiro a merda lá na sombra,
de onde n’alma fervia quanto nem pensavas.
[…]
E de zarolho não podias ver
distâncias separadas: tudo te era uma
e nada mais: o Paraíso e as Ilhas,
heróis, mulheres, o amor que mais se inventa,
e uma grandeza que não há em nada.
Pousavas n’água o olhar e te sorrias
− mas não amargamente, só de alívio,
como se te limparas de miséria,
e de desgraça e de injustiça e dor
de ver que eram tão poucos os melhores,
enquanto a caca ia-se na brisa esbelta,
igual ao que se esquece e se lançou de nós.
(Sena 1989: 185-186)

 Dessa vontade de crítica e resistência a qualquer forma de opressão, emergiu a forte
dialética interpretativa seniana, marca fundamental de sua obra ensaística sobre diversos
temas estéticos, literários, culturais em torno da língua portuguesa, mas não só, haja vista sua
vasta reflexão sobre a cultura inglesa, francesa e clássica.

Podemos ver esse tipo de crítica exercitada, por exemplo, na discussão do que seja a
oficialidade e a  não-oficialidade da literatura (Sena 1971a: 174-178). Sena parte do
princípio de  que ‘as literaturas são oficiais, se oficializam, ou são oficializadas’ (1971a: 174).
Mas o que o crítico entende em ser oficial? Oficial é tudo o que, em suas palavras, ‘não põe
em causa as aparências da ordem estabelecida, ou que apenas episodicamente as põe, como
uma bacanal modesta, a domicílio’ (1971a: 178).  O poeta-crítico considera a coexistência
implícita das duas literaturas: a não-oficial arranca o ser humano de sua conformidade, de
seus padrões estabelecidos, enquanto a oficial significa apenas o mero ‘sorriso da sociedade’.
Escritores como Camões, Dante, Shakespeare e Dostoievski são ‘terríveis, perigosíssimos de
contactar, capazes de destruir para sempre nosso repouso e a nossa confiança de vivermos’
(1971a:176) e, por isso, os seus escritos foram oficializados e permanecem sendo
oficializados
pela ideologia que estiver no poder. Essa argumentação mostrar-se-á importante,
pois é exatamente o Estado-nação, ao nacionalizar as literaturas, ao se apossar do discurso
literário, que impõe a maior das oficializações. A relação literária Brasil e Portugal insere-se
nessa problemática, segundo Jorge de Sena.

Como anteriormente referimos, Brasil foi o porto seguro do escritor quando se viu na
contingência de se exilar de Portugal, em 1959, devido a algumas atividades clandestinas
contra o sistema político vigente. Bem antes de sua vinda, não ignorava o poeta português
alguns nomes da literatura brasileira e já demonstrava grande interesse pelo estudo do
Modernismo brasileiro. No Brasil, Jorge de Sena torna-se professor universitário de literatura,
com a tese Uma canção de Camões (alentado estudo sistemático das canções camonianas), e
continua com maior aprofundamento o processo de conhecimento crítico da literatura e da
cultura brasileira. Foi um dos estrangeiros, tal como Otto Maria Carpeaux, Casais Monteiro,
Paulo Rónai e alguns mais, que buscaram compreender acuradamente a cultura do outro, o
Brasil. Como eles, não foi e nem podia ser um mero ‘escritor turista’ e, por isso, enfrentou
temas  menosprezados ou silenciados. No âmbito desses estudos, o seu  itinerário crítico foi
partir do estudo das relações luso-brasileiras para uma crítica da historiografia oficial da
formação da nação brasileira e da participação portuguesa nesse projeto. A produção a esse
respeito foi divulgada em livro quando, em 1988, a incansável curadora de sua obra, Mécia de
Sena, fez publicar Estudos de cultura e literatura brasileira com ‘48 estudos, resenhas ou
crônicas que sobre o Brasil ou a propósito do Brasil Jorge de Sena escreveu, e cremos que
nada ficou de fora’ (Sena 1988: 11).


 A relação Brasil – Portugal

Como a relação Brasil-Portugal se inscreve na obra crítica de Jorge de Sena? Como o
escritor português percebeu a tão aclamada parceria entre os supostos países ‘irmãos’? Como
um castelo de cartas. ‘As relações culturais luso-brasileiras, descontada a troca de comissões e
consagrações académicas, sempre abrilhantada pelas filarmónicas jornalísticas, sofrem de um
langor muito próximo do desinteresse mútuo’ (1988: 57). Fora das superficiais e inócuas
atividades diplomáticas, não há real contato entre as duas literaturas, não há verdadeiro e
contínuo interesse de compreensão e de  pesquisa de suas realidades político-sociais. É
oportuno lembrar que, somente dezoito anos depois da morte de Jorge de Sena (1978), houve
em Lisboa, a 17 de Julho de 1996, a reunião de Chefes de Estado e de Governo que marcou a
criação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa ─ CPLP ─  entidade que passou a
reunir os países Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São
Tomé e Príncipe;  em 20 de maio de 2002, após tornar-se independente, Timor-Leste tornou-
se o oitavo país membro da Comunidade. Todavia uma comunidade de língua não implica
uma comunidade cultural. Sena também discute que literatura não é apenas o uso
especializado da língua, mas o espaço privilegiado de construções culturais que se confrontam
no texto literário. Assim, brasileiros e portugueses podem estar escrevendo e falando o
mesmo idioma, mas não necessariamente o entendem e interpretam da mesma forma. Como
nos diz o poeta-crítico, ‘sempre nas relações internacionais da cultura, ainda quando língua
mesma as favoreça, há lacunas estranhas, celebridades de acaso, um misto de atraso e
vanguarda sobre o próprio panorama da literatura buscada’ (1988: 61). A isso soma-se a
disparidade de visões de mundo entre as antigas colônias americanas e suas ex-metrópoles,
situação frente à qual, particularmente, a relação Brasil e Portugal é, como veremos,
especialíssima.

Na segunda parte do livro Estudos de cultura e literatura brasileira (1988)(9), reúnem-
se diversos textos sobre a cultura portuguesa e a relação Brasil – Portugal. Entre esses textos,
destacam-se as intituladas  ‘Primeira, segunda, terceira, quarta e quinta carta do Brasil’ que
representam bem a perspectiva seniana. Em sua ‘Quinta carta do Brasil’, sem dúvida a mais
contundente, Sena afirma que Portugal ignora tudo do Brasil e que o Brasil ignora tudo de
Portugal. A ignorância mútua é escorada em preconceito mútuo: se, por um lado, havia uma
tácita afirmação de tutela ou de superioridade, por outro, havia um inconfessado antagonismo.
Do lado português, há a hipertrofia da importância histórica da nação portuguesa (ainda mais
se propagada por um regime autoritário…) acreditando que todos dela partilham, em especial
os brasileiros, pelo fato de o Brasil ter sido uma colônia portuguesa por três séculos (do XVI
ao início do XIX).  Do lado brasileiro, há uma distorção histórica que procura excluir e negar
Portugal de sua construção nacional, incentivando uma visão negativa da colonização
portuguesa que, sob essa perspectiva, apenas explorou, dizimou e tiranizou o novo país, sendo
a escravatura  o processo síntese desse comportamento. O português foi o ‘invasor’ vil que
dominou o brasileiro. Nada mais longe da verdade, e Jorge de Sena bate-se contra essa visão
eivada de idealismo heróico. Defende que o Brasil foi, sim, construído com o sangue de
índios e negros, mas foi também uma construção européia, uma construção portuguesa, fruto
da expansão ultramarítima da Europa Ocidental. Foi o português que empreendeu a
construção de uma rede comercial que atava desde a Ásia até a América, atravessando a
África. Foi o português que ocupou terras, construiu fazendas e engenhos de açúcar. Foi o
português que comerciou escravos e que estabeleceu a ponte entre Brasil e África. E, no caso
insólito de uma nação primeiramente fundada no compromisso dinástico, foi o príncipe do
trono português que declarou a Independência da então jovem nação (10). Entretanto, logo surgiu
a dicotomia colonos e portugueses. Aqueles, chegando à terra colonizada (não importa se ao
Brasil, a Cabo Verde, a Angola ou a alguma outra colônia), passavam a habitá-la como sua e
empenhavam-se em construir fortuna e uma história pessoal, contudo podiam sempre serem
desbancados pelo português recém-saído da Metrópole, sem raízes no território colonial.
Muitas das lutas entre colonos e portugueses, depois valorizadas como precedentes das lutas
nacionais, foram pura e simplesmente lutas por interesses econômicos. E os primeiros colonos
não foram marginais ou degredados, como constantemente se volta a afirmar, pois, como
avisa Sena:  ‘A corrente ideia brasileira de que o Brasil se fez com ‘degredados’ equacionados
com criminosos marginais não se coaduna com o que se sabe dessa imigração, nem com o
rigor do direito penal do tempo, que só não matava por crimes menores, ou exilava só quem
tinha categoria social suficiente para não ser liquidado’ (1988: 381).

Em seus escritos, Sena constata como, na contemporaneidade, Portugal e sua história
continuavam ignorados pelos brasileiros. Mais ainda: a construção nacional do Brasil excluiu,
por diversos motivos, a herança portuguesa. De Portugal o Brasil desconhece quase tudo: ‘o
pior de tudo isto é que o Brasil ignora tudo de Portugal. Onde Portugal exactamente seja, é
matéria muito vaga para alunos mesmo de universidade. Qual seja a nossa História…’ (1988:
96). É claro que o escritor crítico não pretende nem de longe ‘recolonizar’ o Brasil, mesmo
que seja no plano das idéias. Ele mesmo explica: ‘eu vivo no Brasil vai para quatro anos, amo
o Brasil, tenho-o percorrido de ponta a ponta, tenho estudado dele e de nós o que não estudara
ainda, e não faço parte da colónia portuguesa, mas dos quadros do funcionalismo brasileiro,
entre brasileiros’ (1988: 97).  O analista pretende, sim,  discutir a veracidade dos fatos e
desmontar as ideologias por trás das ‘verdades’ aceitas – para se entender um fenômeno
cultural tão complexo como é a literatura. É uma questão de fidelidade – uma das palavras
mais caras ao ideário estético e reflexivo de Sena.

Além disso, não foi só ele quem apontou o desconhecimento da história portuguesa no
Brasil do século XX. O importante historiador brasileiro Evaldo Cabral de Melo, irmão do
poeta João Cabral de Melo Neto, igualmente salientou, no prefácio ao seu O negócio do
Brasil
, essa falta de conhecimento, explicando sua trajetória de pesquisa:

"Quando o autor começou a interessar-se por história,  surpreendeu o
pouquíssimo ou o nada que nós,  brasileiros,  conhecemos da história
portuguesa. (…)  Ainda hoje resulta incompreensível que os departamentos de
história de nossas universidades não ofereçam regularmente cursos de história
portuguesa, que permitam aos brasileiros conhecerem um passado que até a
Independência é tão deles quanto dos portugueses. (…) É provável que se as
preferências do autor se tivessem voltado exclusivamente para o período
nacional da história brasileira,  ele continuasse tão jejuno em história
portuguesa quanto nos dias de finais de 1960 em que fez a sua primeira
excursão pelo assunto, adquirindo numa livraria do Rio, que já não existe, as
Épocas de Portugal Econômico, de João Lúcio de Azevedo, e uma antologia de
Fernão Lopes, organizado por Antônio José Saraiva. Até então, tudo o que ele
sabia de história portuguesa havia sido o admirável capítulo que em Casa
grande & senzala, Gilberto Freyre dedicara ao colonizador lusitano" [grifos
nossos] (Melo 1998: 16-17).

Além dele, Raymundo Faoro, em seus Donos do poder, empreendeu narrar a história
do Brasil (ou melhor, da formação do Estado brasileiro e de sua elite política), desde a
fundação de Portugal no século XII, dedicando outro capítulo à Revolução de Avis, dos fins
do século XIV. Portanto, não foi uma atitude isolada, ou um princípio de nacionalismo que
impeliu Jorge de Sena a mergulhar nessa questão: foi simplesmente a vontade de estudar as
relações luso-brasileiras ‘com um mínimo de coordenação sistemática, para que delas se
possam tirar as lições políticas que se impõem e são hoje da maior urgência e interesse para
Portugal: muito maior que para o Brasil” (1988: 96).


Raízes do desinteresse mútuo
 
A própria construção do Estado-nação Brasil deu-se por um progressivo e acentuado
apagamento de Portugal da História nacional, provocando o desconhecimento acima indicado.
Primeiro, e esse argumento não se encontra em Sena, desde a Independência, precariamente
conduzida pelo sucessor da Casa de Bragança, havia o perigo de Portugal e Brasil,
novamente, se unirem; o que, bem visto, não era mais do interesse da emergente elite
brasileira. A esta interessava tão-somente comerciar os produtos brasileiros diretamente com a
potência da época, a Inglaterra. Portugal perdeu, assim, a sua maior colônia, já que as colônias
africanas não estavam totalmente colonizadas, perda esta que foi, nas palavras senianas, ‘um
choque de que a cultura portuguesa, ainda que não o confesse, se não recuperou até hoje’
(1988: 388). Principalmente por motivos econômicos (os quais, não obstante, poderiam se
aliar a outros motivos ideológicos), ao Brasil, governado por uma escassa elite, não
interessava nem no plano real, nem no plano ideológico reconhecer Portugal como passado –
ou, então,  reconhecer apenas como um passado indesejável. Após os turbulentos períodos do
Primeiro Reinado (1822-1831) e da Regência (1831-1840), seria durante o reinado do
segundo imperador do Brasil, D.Pedro II, o qual assumira em 1840, que todos os alicerces da
imagem do Brasil como autônomo, grande e independente se estabeleceriam,  dissipando a
imagem de Portugal. Com ele, também chegaria às praias brasileiras um novo produto
importado da Europa: o Romantismo. É nesse momento que se realizou ideologicamente a
cisão entre Brasil e Portugal: ‘quando o Romantismo despontava, o Brasil separou-se de
Portugal’ (Sena 1988: 388). Será, realmente, durante a assimilação e aclimatação do
Romantismo europeu, que a nação brasileira, durante o período de consolidação que é o
Segundo Reinado, adquire os seus símbolos, elabora a sua história e geografia, e escreve a sua
literatura. Foi um projeto de Estado, como todos o sabem, e teve, em D. Pedro II, o seu
principal mecenas.

Outro lado é a crença generalizada da falta de desenvolvimento brasileiro ser causada
pela colonização portuguesa. Teria o Brasil sido diferente se fosse colonizado por ingleses ou
por holandeses? Na verdade, o Brasil não teria existido, nem teria sido o que atualmente é;
nem todas as antigas colônias de Inglaterra e dos Países Baixos foram tão bem sucedidas
como a opinião de alguns críticos  querem fazer crer. A suspeita e, até mesmo, descrédito em
relação à Península Ibérica, lembra Sena, provêm das lutas intestinas entre católicos e
protestantes, muito financiados aqueles pelos monarcas espanhóis, e esse descrédito só
aumentou na proporção em que Portugal e Espanha não se industrializavam ou não alteravam
drasticamente sua organização social, enquanto os outros países, que se tornariam potências,
se industrializavam e aceleradamente se desenvolviam. A partir de então, a Península Ibérica
passou a ser a parte ‘pobre’ da Europa Ocidental, mas com um agravante para Portugal, pois,
enquanto a Espanha, bem ou mal, dominara grandes extensões de terra no mundo e também
na Europa, Portugal só se expandira para fora do Velho Continente. Assim, na argumentação
crítica de Sena (1988: 390), Portugal, mais que Espanha, foi eliminado das estreitas
perspectivas das mentalidades centro-européias. Desse modo, o estudioso brasileiro, ao ler os
estudos dessas mentalidades, ‘via-se, por aquilo em que descendia étnica e culturalmente dos
Portugueses, como descendente de um povo racialmente inferior pelas misturas étnicas, sem
status abertamente conhecido no panorama europeu’ (1988: 390). O Brasil viu-se relegado a
herdeiro de um país subordinado tanto política e econômica quanto ideologicamente. País
periférico, ex-colônia de outro país periférico. Urgia negar essa herança, enfraquecê-la ou, ao
menos, pedir desculpas por dela tratar – como muitas vezes foi feito, e essa perspectiva Jorge
de Sena salienta na seguinte passagem:
"Mas  continua  perfeitamente  patente  em
historiadores e críticos da literatura brasileira, quando se desculpam de ela ter
nascido de uma literatura «menor» (o prestígio internacional da cultura
espanhola nunca permitiu este problema nos mesmos termos, para os países da
América espanhola), ou nos poucos críticos que, no Brasil, se ocupam de
literatura portuguesa, e que, com raras excepções, se sentem constrangidos ante
ela e receosos de serem suspeitos de lusofilia" (1988: 391).

A questão torna-se mais problemática quando envolve a literatura de cada um dos
países: desde a formação das histórias das literaturas,  houve discussões sobre as
nacionalidades dos escritores (11), assim como algumas polêmicas sobre a correção do
português escrito por brasileiros e outras de menor calibre. As relações entre as literaturas
brasileira e portuguesa, enfim, são marcadas por tudo o que não atende os critérios de cultura
exigidos por Sena: casualidade, superficialidade e aceitação tácita, bem longe das categorias
críticas necessárias: dúvida metódica, juízo analítico e  visão sintética. Não formam um
conjunto, nem mesmo um conjunto de influências, sendo ocasionais e fortuitos os diálogos
entre uma e outra pela barreira de preconceitos, pela falta de interesse, tornando-se ainda mais
gritantes as diferenças. Sena, na condição de professor de literatura no Brasil, foi um dos que
mais lutou para modificação desse quadro, mas foi, em parte, vã a tentativa. A cultura
brasileira  subsiste cada vez mais da negação de Portugal, mesmo como elemento de sua
memória histórica.

O Brasil nega Portugal para se afirmar como nação. Se lembrarmos que um grande
estudioso da literatura brasileira, Antônio Cândido (1997), afirmou que a literatura brasileira,
pelo menos no período de sua gênese, foi uma literatura empenhada, devemos reconsiderar o
quanto de imposição ideológica existe na criação literária no Brasil. Foi exatamente para
tentar fortalecer a idéia de nação que se formaram determinados critérios de nacionalidade (a
enumeração é de Sena): a paisagem luxuriante e exótica brasileira; o homem índio idealizado;
a descrição pitoresca e/ou dramática dos costumes; entre outros. E, segundo ainda o poeta-
crítico, ‘um dos resultados mais evidentes e desastrosos deste critério foi a desconfiança de
grande parte da crítica em relação ao primeiro grande escritor de estatura universal, que o
Brasil produziu: Machado de Assis. Este escritor refinadamente urbano e carioca seria
“brasileiro”?’(1988: 387). No ensaio que dedicou a Machado de Assis, Sena ainda foi mais
claro sobre a questão da grandeza literária: não são as literaturas nacionais grandiosas por si,
mas sim os escritores que são notáveis pela importância literária de sua obra. Ora, Machado
de Assis é o primeiro que subverte as tendências oficiais e oficiosas da literatura brasileira de
então, de uma literatura exótica e pitoresca (que atendia ao diferencial de mercado em
comparação às literaturas européias…), e foi ele quem ‘longamente pagou criticamente o
preço de ter buscado ser “brasileiro” por dentro, quando não mais se lhe pedia que o fosse por
fora’ (1988: 328).

O crítico português desenvolve, nos estudos a que se dedicou sobre importantes
escritores brasileiros, o confronto entre a existência do grande escritor  e a nação mesquinha
(ou que se considera mesquinha…). Nas literaturas consideradas periféricas, há sempre duas
formas igualmente perniciosas de provincianismo: o ufanismo glorificador, por meio do qual
qualquer obra nacional é um grande feito na história da humanidade; e – mais sutil – o
derrotismo cosmopolita, em que tudo o que é feito na terra não tem importância, sendo só
digno de valor o que provém do exterior (ontem França, hoje os EUA…). São duas faces da
mesma moeda que a crítica lúcida de Jorge de Sena tenta separar.
Em referência a essa imagem brasileira de contínuos atrasos, o ensaio mais incisivo
que Sena escreveu sobre um escritor brasileiro, sob essa perspectiva, é ‘Os sertões e a epopéia
do século XIX’ (1988: 207-221), uma das leituras mais argutas e instigantes da obra de
Euclides da Cunha (12). Misto de reportagem documentada, obra de arte e panfleto gigantesco,
Os sertões do escritor brasileiro, segundo o poeta-crítico português, é uma verdadeira epopéia
da luta fratricida no interior do Nordeste, onde a História e a negação da História se
confrontaram, em um dos momentos mais sombrios da  memória brasileira. A tensão entra a
nação mesquinha e o grande escritor encontra aí um dos seus melhores exemplos:

Não é dos menores paradoxos da história literária, que as grandes obras tenham
sido escritas quando os seus autores achavam que as suas pátrias não mereciam
que eles as escrevessem… Provavelmente, não mereciam mesmo, já que, na
verdade, elas são sempre, apesar das nossas presunções e susceptibilidades,
inferiores aos grandes homens que produzem. Mas acontece que, não obstante
isso, eles as escreveram, e é precisamente o que os distingue da chusma
inglória dos que achando que não vale a pena fazer nada, cumprem realmente
as suas convicções… e não fazem nada. Os grandes escritores pensam que tudo
está perdido, mas têm em si mesmos uma confiança última. E essa confiança
última com que escrevem as suas obras-primas para nos chicotearem a golpes
de palavras, é afinal aquilo que, se os não salva a eles, nos salva a nós (Sena
1988: 219).

Não estaria o escritor português referindo-se a si mesmo? Estava, e a todos os outros
grandes que escreveram e viveram, cada um a seu modo, as amarguras de seu tempo e de seu
lugar.
 

Olhares que não se cruzam

 O pensamento de Sena, em síntese,  é que a negação de Portugal pelo Brasil é, de
certa forma, uma negação do atraso, mas, dialeticamente, acaba sendo uma das formas mais
contundentes de retardamento. Ora, não é a ignorância uma das formas mais emblemáticas de
atraso? Ao negar Portugal em sua História, o Brasil ignora suas raízes e impede o
conhecimento de sua própria identidade cultural.
Por outro lado, no que diz respeito ao não reconhecimento do Brasil por Portugal,
Sena não deixa de observar em diversos artigos que as relações entre os dois países também
não se desenvolvem por uma visão provinciana portuguesa que não compreende a
complexidade regional e nacional brasileira. Na ‘Primeira carta do Brasil’, datada de março
de 1961, o escritor inicia afirmando que

"Portugal não faz uma ideia clara do que seja a actividade intelectual e literária
do Brasil. Com uma imensidade territorial que, hoje, uma extensa e intensa
rede aérea procura pôr à escala dos modernos contactos humanos, e com uma
estrutura política federalista que é de difícil compreensão, na sua realidade e
nas suas consequências, para o português de tradição centralista, o Brasil tem,
na sua vida espiritual, características muito diversas das que mesmo o
intelectual português que de leitura o conhece e admira é capaz de supor" (1988:
67).

Se é verdade que, por um grande período (anos 40 a 60), a literatura brasileira foi
muito popular em Portugal, tornando-se até paradigma para os escritores neo-realistas que
viam na produção regionalista brasileira  modos e formas novas de abordar os problemas
sociais do país, com um discurso livre e ousado de questionamento nacional, Sena constata,
em seus textos da década de 60, o ‘absentismo português’, o desconhecimento que os
portugueses mantém em relação à realidade brasileira, sua diversidade natural e social, sua
complexidade econômica e cultural. Situação que permanece até hoje, como também discute
Eduardo Lourenço em A Nau de Ícaro seguido de imagem e miragem da lusofonia (1999), por
exemplo, ao afirmar que

"O discurso português sobre o Brasil, tal como uma longa tradição retórica e
historiográfica recita e reescreve sem cessar, é uma pura alucinação nossa, que
o Brasil − pelo menos desde há uma século − nem ouve nem entende. Já é
tempo de sabermos ao mesmo tempo das excelentes razões que os Brasileiros
têm para não ouvir, nem entender, tal discurso e das ilusões patéticas, mas
exteriores,  que cultivamos para não abdicar desse diálogo de surdos
institucional que, na sua essência e na sua realidade, o pseudodiscurso,
supostamente privilegiado, que estruturava essa invenção mítica da outrora
chamada comunidade luso-brasileira" (1999: 137).

O fato que deve ser salientado é a antecedência crítica seniana em pensar as relações
luso-brasileiras e apontar possíveis explicações para velhos problemas de incompreensão e
desconhecimento. Os estudos senianos sobre o Brasil na perspectiva de um olhar português
são, sem dúvida, um mergulho profundo na cultura brasileira e uma reflexão séria e abalizada
sobre os entraves sócio-político-culturais que impedem que Portugal e Brasil realizem
realmente o projeto da lusofonia.

Infelizmente a contribuição de Jorge de Sena, esse intelectual português em terras
brasileiras, permanece ainda ignorada entre os estudiosos do Brasil, pois continua a ser cada
vez mais restrito o interesse pela cultura portuguesa no Brasil contemporâneo e, portanto, são
esquecidos ou ignorados seus escritores e pensadores, ressalvados alguns espaços acadêmicos.
No entanto, o que o Sena desejava era simplesmente o reconhecimento da herança portuguesa
como uma exigência para o Brasil melhor se compreender,  alterando a sua realidade de
injustiça,  assim como  Portugal deveria compreender o seu real lugar histórico em relação ao
país de língua portuguesa do outro lado do Atlântico. Seu trabalho crítico-analítico
demonstrou muito claramente que era questão vital (e ainda é…) a aproximação real entre os
dois países, não só com o fortalecimento de uma cultura de língua portuguesa como também
de novas relações sócio-político-econômicas no mundo contemporâneo. Homem de Letras,
buscou especialmente mostrar aos portugueses o Brasil para além de imagens míticas e/ou
turísticas e, para os brasileiros, a importância cultural de entender a literatura  como um
processo permanente de compreensão do que seu povo foi e é, com a discussão perspicaz de
diferenças e possibilidades de diálogo. Projeto lúcido e empenhado que Jorge de Sena,
diferente dos escritores-turistas, propôs e buscou realizar na sua obra crítica e literária.

Patas de prata
losango de asas brancas
de negro debruadas
plumas cinzentas como cauda insólita
e a longa e fina tromba alaranjada
instântanea língua
olhos de esfera negra que me fitam
da estática assustada imóvel calma
que as patas pousam na vidraça
um animal      ser vivo       e  borboleta
a mosca como eu olha-a espantada.
                                                          5/03/1964 
                 
(poema  ‘Borboleta brasileira’, Sena 1989: 65-66)

 

 

Notas:

1 Sobre esse período, anota Eugénio Lisboa: ‘Tomada a decisão de um exílio voluntário, fixa-se no
Brasil, como catedrático contratado de Teoria da Literatura na Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras de Assis, no Estado de São Paulo. Dois anos depois, em 1961, mudava-se para a Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras de Araraquara, como catedrático contratado de Literatura
Portuguesa, cargo de que se virá a licenciar em Outubro de 1965, altura em que decide partir para os
Estados Unidos, e do qual pedirá a demissão em 1967. Entretanto defendera no Brasil tese de
doutoramento em Letras e de livre-docência em Literatura Portuguesa, com o tema: “Os sonetos de
Camões e o soneto quinhentista peninsular”. Adquirira também a cidadania brasileira’ (1979: 14).

2 Comenta Mécia de Sena: ‘Cremos poder dizer, sem receio de exagero, que o Brasil proporcionou a
Jorge de Sena os seus anos de máxima produtividade’ (in Sena 1988: 10).

3 Destacamos:  Uma canção de Camões (análise estrutural de uma tripla canção camoniana
precedida de um estudo sobre a canção petrarquista e sobre as canções e as odes de Camões,
envolvendo a questão das apócrifas),  1ª edição de 1966; Os sonetos de Camões e o soneto
quinhentista peninsular (as questões de autoria, nas edições da obra lírica até às de Álvares da
Cunha e de Faria e Sousa, revistas à luz de um critério estrutural à forma externa e da evolução do
soneto quinhentista ibérico, com apêndice sobre as redondilhas em 1595-1598, e sobre as emendas
introduzidas pela edição de 1598), 1ª edição de 1969; A estrutura de ‘Os Lusíadas’ e outros
estudos camonianos e de poesia peninsular do século XVI, 1ª edição de 1970. Aos interessados
dessa produção específica, ver o artigo ‘Podereis roubar-me tudo: subsídios para uma antologia da
presença de Camões na produção literária de Jorge de Sena’, de Maurício Matos, em  Santos, 1999:
241-266.

4 As relações entre Portugal e Brasil têm merecido diversos estudos de especialistas. Uma relação
colonial tensa e uma relação pós-colonial complexa  explicam muitas vezes o grande afastamento
que há entre os dois países, malgrado as tentativas em campos diversos para maior diálogo e
intercâmbio. Sobre isso, seguir reflexão de Lourenço 1999.

5 Sobre Jorge de Sena, escreve Frederik G. Williams: ‘Jorge de Sena (1919-78) é reconhecido como
um dos maiores intelectuais das letras portuguesas. A sua erudição cultural é esmagadora e
universal. A sua produção criativa e crítica é vastíssima e abarca diversos géneros: poesia, teatro,
conto, novela, romance, ensaio, crítica, biografia, história, tradução, teoria literária, correspondência
e diário. Ao todo, incluindo os que saíram postumamente, Sena publicou mais de 100 volumes, sem
contar as subsequentes edições ou as traduções da sua obra. Até à data já apareceram traduções em
volume em nove línguas, a saber: alemão, castelhano, catalhão, chinês, francês, holandês, inglês,
italiano, e sueco’ (in  Santos 1999:117).

6 Este ensaio resultou de projeto de pesquisa, coordenado pela co-autora, Diálogos e silêncios na
poesia portuguesa: décadas de 10 a 60, realizado no Instituto de Letras da Universidade Federal
Fluminense, Niterói – Rio de Janeiro, Brasil, no período de 2001 a 2003 e continuado no Pólo de
Pesquisa sobre Relações Luso-Brasileiras – PPRLB do Real Gabinete Português de Leitura do Rio
de Janeiro, a partir de 2004.

7 Do prefácio à primeira edição de Poesia I: ‘É que à poesia, melhor que qualquer outra forma de
comunicação, cabe, mais que compreender o mundo, transformá-lo’ (Sena 1986: 25).

8 Somente em 1974 ocorreria a queda do salazarismo com a Revolução do 25 de Abril,
mundialmente conhecida como a Revolução dos Cravos . A respeito, ver Marques 1997.

9 Esse livro reúne 48 estudos sobre o Brasil e sua cultura. Originalmente tais estudos foram
resenhas, crônicas, comunicações a congressos ou colóquios, etc apresentados por Sena ao longo
dos anos de docência. Escreve Mécia de Sena  no texto de abertura da obra ‘Em forma de prefácio’:
‘Na realidade todas estas comunicações, crónicas, etc. eram parte do titânico esforço que Jorge de
Sena se impusera para fazer conhecer e respeitar o Brasil e a sua cultura. É que se a ignorância do
Brasil para lá do samba é grande em Portugal, ela é, nos Estados Unidos, absolutamente
astronómica, e, mesmo as pessoas que alguma vez o visitaram e até descobriram que a capital não
era afinal Buenos Aires e se não falava lá uma “espécie de espanhol”, não se deram conta do seu
incrível potencial económico e humano nem da sua grande literatura’ (1988: 11-12). O livro é
dividido em cinco partes: I- Sobre Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade, etc [ outros
escritores]; 2- ‘Cartas’ e crônicas; 3- Sobre Manuel Bandeira; 4- Prefácios, resenhas, verbetes e
outros; 5- Comunicações, ensaios, conferências, etc, e um substancial verbete.

10 Quando D. João VI viu-se obrigado a voltar a Portugal, deixou no Brasil seu filho D. Pedro, o
qual  acabou por proclamar a independência brasileira em 07 de setembro de 1822. D. Pedro I, já
Imperador do Brasil, viu-se obrigado a voltar a Portugal  para defender o trono português de sua
filha Maria da Glória (D. Maria II), ameaçado pelos absolutistas liderados por D. Miguel, o qual
usurpara o trono. Para isso, D. Pedro I abdicou o trono brasileiro (1831) a favor de seu filho
D.Pedro, ainda criança, que se tornará o segundo imperador do Brasil, a partir de 1840. Ver
Marques 1986. A propósito, lembremos que, em 2008, comemoram-se os 200 anos da chegada da
Família Real Portuguesa ao Brasil, Rio de Janeiro.

11 No caso brasileiro, ver as afirmações que Jorge de Sena, em seu artigo sobre o Brasil colonial,
tece sobre as nacionalidades dos escritores do período colonial e, em especial, sobre o padre
Antônio Vieira. Sena considera esse período como sendo patrimônio cultural comum das duas
nações (1988: 377-436).

12 Euclides da Cunha (1866-1909) é autor de Os sertões: campanha de Canudos (1902), sua obra-
prima, no qual descreve a campanha de Canudos, em 1897, no nordeste da Bahia, com a reação do
governo republicano contra o arraial de Canudos e sua gente liderada por Antônio Conselheiro.
Acompanhando de perto a investida das tropas republicadas (quatro expedições), conseguiu reunir
material para, durante cinco anos, elaborar Os sertões, que se divide em três partes: ‘A terra’, ‘O
homem’ e ‘A luta’. Nelas o autor descreve e analisa as características geológicas, botânicas,
zoológicas e hidrográficas da região, os costumes e a religiosidade sertaneja, para além dos
acontecimentos em torno de Antônio Conselheiro.  Para acompanhamento da biografia e
bibliografia detalhadas dessa figura literária brasileira, verificar www.euclides.site.br.com , onde se
afirma que ‘Os sertões valeram ao autor grande notoriedade e vagas na Academia Brasileira de
Letras e no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro’.
 

 


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LISBOA, Eugénio (pref. e sel.). Versos e alguma prosa de Jorge de Sena. Lisboa: Arcádia e Moraes. 1979.
LOURENÇO, Eduardo. A nau de Ícaro seguido de imagem e miragem da lusofonia. Lisboa: Gradiva, 1999.
MARQUES, A.H. de Oliveira. História de Portugal, 13ª ed., vol.2 Lisboa: Presença, 1997.
______. História de Portugal, 3ªed., vol.3 Lisboa: Palas, 1986.
MELO, Evaldo Cabral de. O negócio do Brasil – Portugal, os países nórdicos e o Nordeste,1641-1669, 2a ed. Rio de Janeiro: Topbooks, 1998.
RICOEUR, Paul, 2002. Del texto a la acción. México: Fondo de Cultura Económica.
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______. Poesia I. Lisboa: Edições 70, 1986.
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______. Estudos de cultura e literatura brasileira. Lisboa: Edições 70, 1988.
______. 40 anos de servidão. Lisboa: Edições 70, 1989.

 

 

* Professora de Lilteratura Portuguesa nos Cursos de Graduação e Pós-Graduação do Instituto de Letras da Universidade Federal Fluminense (UFF)
** Mestre em Literatura Portuguesa pela UFF
Ensaio originalmente publicado no periódico Hispanic Research Journal, Londres, v.10. number 3, june 2009. p.258-271. ISSN 1468-2737, acesso via http://www.citeulike.org/rss/journal/maney-hrj.